terça-feira, 30 de maio de 2017

O Governo Temer e a Ética do discurso




Qual a ética do discurso do Governo Michel Temer (PMDB)? Existe uma ética no discurso do atual governo? Não estamos falando aqui dos casos de corrupção, especialmente da operação lava-jato e todas as denúncias que atola na lama o presidente Michel Temer até o pescoço. Nosso objetivo aqui é analisar a ética do discurso do governo Temer em relação ás reformas que ele tem levado acabo, especialmente a previdenciária e a do ensino médio. Mais especificamente o discurso por meio das peças publicitárias que busca promover tais reformas.
Ao analisar a contribuição do filósofo alemão Jurgen Harbermas a cerca da ética do discurso, Reese-Schafer (2008) afirma que “a ética do discurso busca dar à ética um fundamento racional através do que os pressupostos da comunicação interpessoal permite identificar os princípios morais realmente irrenunciáveis que devem ser a base de toda convivência humana: o reconhecimento do outro, a não-coação da comunicação e a disposição para solução de problemas e a fundamentação de normas através do discurso livre e igual”.
Não é o que vemos, por exemplo, no discurso do governo Temer através das peças publicitárias que buscam justificar a reforma do ensino médio e a reforma da previdência. Enquanto na reforma do ensino médio o governo usa a torto e a direito as estatísticas que apontam que mais de 80% da população, especialmente os jovens, apoiam a reforma do ensino médio. O mesmo não se vê quando se trata da reforma da previdência, até por que se sabe que as pesquisas apontam que menos de 10% da população apoiam essa reforma.
Logo podemos concluir que quando favorece aos objetivos do governo, a opinião da população é levada em consideração, como também serve para justificar a continuidade do projeto, mesmo que haja questionamentos. Por outro lado, quando a população é contrária aos objetivos do governo, essa posição é completamente ignorada. E pior, o governo tenta coagir a população fazendo terrorismo psicológico, obrigando o povo a comprar o discurso do governo. É isso que vemos na peça publicitária que promove a reforma da previdência onde vemos a afirma que se a tal reforma não for feita não terá dinheiro para pagar as aposentadorias futuramente. Com isso o governo busca colocar pânico em quem já está aposentado, obrigando-os a defender a reforma da previdência. Com medo de não receber seu dinheiro no futuro trabalhador briga com trabalhador.
É. Lamentavelmente parte da população acaba comprando esse discurso antiético, é o que vemos no avanço da reforma trabalhista em discursão no senado federal e na própria reforma do ensino médio – onde o governo exibe com orgulho as estatísticas que apontam a aprovação da população. Agora se utilizam da mesma tática para tentar reverter à desaprovação pela população da reforma da previdência. Recursos nesse sentido não têm faltado. Isso sem falar na propaganda extraoficial feito pela grande mídia.
Para Harbermas (1978) “de acordo com a ética do discurso, uma norma só pode pretender validez quando todos os que possam ser concernidos por ela cheguem (ou possam chegar), enquanto participante do discurso prático, a um acordo quanto à validez dessa norma”. No caso do governo Michel Temer e suas reformas o que há é um discurso impositivo que tenta através da coação obrigar a população a aceitar o projeto de desmonte do estado e usurpação dos direitos sociais. Quando esse discurso não funciona, como temos visto no caso especifico da reforma previdenciária, o governo não pensa duas vezes em impor suas vontades através das forças de repressão policial, incluindo as forças armadas.
Por fim cabe destacar que do ponto de vista da moral o governo Michel Temer tem agido conforme os interesses da classe que representa. Logo ao afirmarmos que não existe ética no seu discurso não estamos dizendo que não há moral. E fazemos essa afirmação para que a população não se iluda a respeito de quais interesses esse senhor representa. Esperar, portanto, que ele haja de forma contrária é iludir-se. Cabe a nós resistir, e não comprar esse discurso antiético que nada interessa para classe trabalhadora. Pois é um discurso das classes dominantes que pretende continuar com seus privilégios e regalias, enquanto o trabalhador é cada dia mais espoliado e aleijado dos seus direitos fundamentais.
Pedro Ferreira Nunes – É Educador Popular, Coordenador Geral do Centro Acadêmico de Filosofia da UFT e militante do Coletivo José Porfírio.

quinta-feira, 25 de maio de 2017

Breves comentários a cerca da conjuntura

A conjuntura atual não tem nos dado muito tempo para sentarmos e fazermos uma analise conjuntural mais aprofundada. Isso não é tão ruim, sobretudo por que significa que as ações práticas tem nos demandado mais atenção. E sem duvidas é melhor agir do que ficar teorizando. No entanto não poderia deixar de tecer mesmo que de forma breve alguns comentários a cerca de questões conjunturais que muito nos incomoda, especialmente as questões regionais que são muitas vezes secundarizadas diante de uma conjuntura nacional cada vez mais caótica.

Não questiono esse fato, pois nós mesmos estivemos no ultimo período nos dedicando a construção da greve geral quase que 24 horas por dia bem como nas articulações para o fortalecimento do movimento estudantil revolucionário e de luta na Universidade Federal do Tocantins. E agora voltaremos as nossas energias mais uma vez para o Fora Temer e por diretas já! Mas claro, em nenhum momento deixamos ou deixaremos de esquecer do nosso quintal.

Nessa linha faremos aqui uma breve analise dos cinco primeiros meses da administração do Tércio Neto (PSD) a frente do executivo municipal de Lajeado. Depois comentaremos o projeto de lei que cria o feriado municipal do “Dia dos pobres” no município. Após essa analise local partiremos para questões regionais como a liberação da licença ambiental para construção da UHE Monte Santo no Rio do Sono. E partindo dai falaremos da questão ambiental no Tocantins – a necessidade da continuidade da luta contra a UHE Monte Santo. Relacionando com essa questão ambiental falaremos do cinismo como a marca do governo Marcelo Miranda (PMDB). E por fim, concluiremos falando sobre o cenário politico regional – articulações e alianças para 2018. Especialmente, o posicionamento da senadora Kátia Abreu que tem nos chamado atenção como também de setores do PT, do PC do B e do PSOL.

1-O velho vestido de novo

O que falar dos 5 primeiros meses da administração do Tércio Neto (PSD) a frente do executivo municipal de Lajeado? O que tem sido feito de diferente em relação à gestão anterior? O que foram as obras inauguradas durante o aniversário da cidade no último dia 05 de maio (Quadra poliesportiva, 5 casas populares, campo de futebol e torre telefônica na zona rural) se não obras que foram deixadas pela gestão anterior quase concluídas? O que a atual gestão tem feito se não manter a mesma estrutura e o mesmo programa de governo da gestão anterior? Aliás, tem sim algo de diferente. Uma equipe de comunicação/marketing muito atuante – que tem feito enorme barulho nas redes sociais. Mas que certamente não moram e nem vivem a realidade dos lajeadenses, pois se não, não estariam falando tanta besteira. Mas no final das contas são pagos para isso – maquiar a realidade. No entanto, nesses 5 meses de administração, o que está claro é o que sempre dissemos – Que essa administração seria mais do mesmo – uma continuidade da gestão anterior, isto é, o velho transvertido de novo.

2- Projeto de lei tenta criar o feriado do “Dia dos pobres” em Lajeado

Enquanto isso na Câmara de Vereadores de Lajeado o Vereador Adilson Mascarenhas (PTB) apresentou um projeto de leis criando o feriado municipal do “Dia dos Pobres” a ser comemorado em outubro. Agora os pobres de Lajeado não tem do que reclamar, pelo contrário, devem ter orgulho de serem pobres, ainda mais agora que terão um dia para comemorar o orgulho de ser pobre. E assim em vez de combater a pobreza, se aprovar esse projeto de lei, a Câmara de Vereadores de Lajeado vai esta indo na contramão, pois instituir o dia do pobre não é combater a pobreza, mas sim aceita-la. Ora essa. Se os vereadores querem fazer alguma coisa pelos pobres do Lajeado, por que não aprovam um projeto de leis diminuindo seus salários e destinando esse recurso para projetos comunitários?! Por mais nobre que pareça, esse projeto de lei só mostra uma coisa – que ao invés de encarar os problemas de frente, o que se esta tentando é joga-lo para baixo do tapete. Ai, de nós, ai de nós. É muita mediocridade, é muita mediocridade por parte desses que se dizem representantes do povo.

3- Naturatins libera licença ambiental para construção da UHE Monte Santo

O Naturatins cumprindo o seu papel de homologador das demandas do hidronegócio e do agronegócio no Tocantins liberou a licença ambiental para construção da Usina Hidrelétrica Monte Santo no Rio do Sono – na divisa das cidades de Novo Acordo e Rio Sono. Logo se vê que em nenhum momento o governo Estadual através do seu órgão de “proteção ambiental” levou em consideração a população que nas audiências públicas na sua grande maioria se posicionou contra a construção da UHE e nem o fato de que o projeto apresentado pela empresa responsável pelo empreendimento apresentava de forma clara quais seriam os impactos ambientais na região, denuncia apresentada pelo movimento local contra a construção da UHE Monte Santo.

4- A Luta continua: Não á UHE Monte Santo!

É preciso ressaltar que quando entramos nessa briga e denunciamos a construção da UHE Monte Santo. Já havíamos alertado que não nos iludíssemos quanto ao papel do Naturatins.

... não podemos ter nenhuma duvida quanto ao papel do Naturatins nesse processo. Pois o Naturatins no Tocantins existe justamente para homologar os interesses das elites agrárias e correr atrás de pescador – logo, se a população não se mobilizar, o Naturatins vai com certeza liberar a licença ambiental para construção da UHE Monte Santo. (Nunes, 2016)

Não deixemos aqui de reconhecer a belíssima mobilização feita pela população através do Comitê Popular Contra a Construção da UHE Monte Santo. Mesmo com essa mobilização o Naturatins liberou a licença ambiental. O que não quer dizer que tenhamos que dá essa luta como perdida. Continuemos mobilizados, pois a luta continua. Gritemos – Não a UHE Monte Santo.

5- O cinismo como marca de Governo

Ao mesmo tempo em que o governo Marcelo Miranda através do Naturatins aprova uma licença ambiental para construção de mais uma Usina Hidrelétrica no Tocantins – impactando de forma irreversível o nosso bioma. Realiza uma feira agropecuária com o tema “Água, sustentabilidade de vida”. Ora, a construção de mais uma UHE vai justamente na contramão da utilização sustentável dos recursos hídricos do Tocantins. Isso mostra muito bem a característica desse governo – o cinismo. Isso mesmo, não há algo melhor para caracterizar o governo Marcelo Miranda se não o cinismo. E não fazemos essa afirmação diante dessa questão isolada. É só analisar as atitudes e ações desse governo diante de várias questões como as greves no serviço público, o caos na saúde, o ajuste fiscal, os casos de corrupção entre outros. Essa questão especifica, é apenas mais um dos muitos exemplos que mostra o cinismo como marca desse governo. Ora o tema da Agrotins deveria ser: Água, mercantilização da vida! Pois é de fato o que esse governo a serviço do agronegócio e do hidronégocio faz.

6- - É golpista, mas não larga o osso

A militância de uma corrente interna do PT no Tocantins não abre mão de acusar o PMDB de partido golpista. No entanto recusam-se a deixar os cargos que ocupam no governo Marcelo Miranda (PMDB). Chegam inclusive ao extremo de defender um governo indefensável – vendo avanços que não existem. O que dá para perceber é que esses burocratas estão mais preocupados com seus cargos do que propriamente com o sucateamento do partido no Estado, que nas ultimas eleições municipais, por exemplo, conseguiram eleger apenas dois prefeitos. Para manter a coerência no discurso o rompimento do PT com o PMDB deveria ter ocorrido há muito tempo. Mas só agora percebemos esse movimento, já quase no apagar das luzes desse governo, mesmo assim, com resistência. Já que parte da militância recorreu à direção do partido nacionalmente para continuar usufruindo das regalias do poder.

7- O malabarismo teórico do PC do B

Recentemente o PC do B no Tocantins soltou uma nota política justificando o seu apoio à pré-candidatura de Carlos Amastha (PSB) ao governo do Tocantins em 2018. Tentam fazer todo um malabarismo teórico para justificar o injustificável. Chegando inclusive a afirmar que se trata de uma candidatura progressista. Sinceramente não sei de onde eles tiram tanta criatividade. O fato é que não dá para levar a sério um partido que tal como o PT afirma que a presidenta Dilma sofreu um golpe. Mas faz parte de uma gestão onde os dois principais partidos (PSB do prefeito Amastha e PSDB da vice Cintia Ribeiro) estavam diretamente envolvidos na defesa do impeachment de Dilma Rousseff. E que se caso o megaempresário vier a ser eleito governo do Estado, esse megaempresário que o PC do B diz ser a alternativa progressista para o Tocantins, quem assumirá a prefeitura da capital será o PSDB. Ora, senhores, dizei-me, que tática é essa de fortalecimento da classe trabalhadora?

8- Os efeitos dessa tática

A tática do PC do B do Tocantins tem o seu lado positivo, por exemplo, tem atraído um bando de oportunistas que estavam em outros partidos encantados pela possibilidade de terem um quinhão no loteamento de cargos num possível governo Amastha. Quem se deu bem nisso foi o PSOL, pois as figuras que deixaram o partido para irem para o PC do B, incluindo a ex-presidente e o secretário geral da sigla no estado, mais prejudicavam do que contribuíam para construção e fortalecimento do PSOL-TO. A tática do PC do B do Tocantins é uma ótima oportunidade para os oportunistas que vivem buscando um atalho para alcançar seus objetivos. Que vão para o PC do B ou para o PT. E Deixem os partidos de luta para aqueles que lutam.

9- Por outro lado

É triste ver que um partido de referência a nível nacional como o PSOL, com figuras como Glauber Braga, Marcelo Freixo, Renato Roseno, Chico Alencar, Ivan Valente, Jean Willis, Luiza Erundina, Edimilson Rodrigues entre outros, em terras tocantinenses tem servido apenas como trampolim politico para diversos bandos de oportunistas que hora e outra tomam o partido. Tal fato não ocorreria se setores do partido a nível nacional não bancasse esses oportunistas. Por tanto, em ultima analise, a responsabilidade pela falta de credibilidade bem como de crescimento do PSOL no Tocantins não é dos oportunistas que hora e outra chegam à direção do partido no estado. Muito pelo contrário, a responsabilidade é do setor majoritário do PSOL Nacionalmente que banca esses oportunistas em detrimento da militância verdadeiramente de esquerda, coerente e consequente. Que é minoria, mas não mancha o nome do partido.

10- Kátia Abreu paz e amor?

Por fim não poderíamos deixar de comentar a nova imagem que a senadora Kátia Abreu tenta construir, isto é, de um político progressista, e com isso tem inclusive flertado com ideias de esquerda. Critica ferrenha do governo Marcelo Miranda – que ela ajudou eleger. De Michel Temer – que a trouxe para o PMDB. E uma das principais vozes contra a o impeachment de Dilma Rousseff – de quem foi ministra da Agricultura. Entrando assim em rota de coalizão com setores mais radicais dos ruralistas e da direita tradicional. Kátia Abreu que outrora fora uma das parlamentares preferidas da revista Veja, tida como uma grande liderança da direita a nível nacional, eleita pelos movimentos ambientais como a miss motosserra, principal financiadora do MATOPIBA, agora tenta mudar sua imagem. Ora, o que uma pretensão politica não faz com alguém. A radical Kátia Abreu posa agora de boa moça. Tudo para obter apoio a sua pretensão de se candidatar ao governo do Estado. E não faltaram oportunistas que se dizem de esquerda que caíram nesse engodo.

11- Pela construção de uma verdadeira alternativa de esquerda no Tocantins

De acordo com Netto (2013) “A crise contemporânea do mundo do capital abre para nós uma oportunidade concreta de, exercitando a crítica radical, fomentar a reconstituição e a renovação de uma cultura política socialista”. Sabemos que não é uma tarefa fácil, especialmente no Tocantins, onde não temos uma tradição de lutas da esquerda revolucionária. No entanto não podemos abrir mão de exercitar a crítica radical, seja a quem quer que seja, sobretudo a setores que se dizem de esquerda, mas que estão a serviço da direita. Como bem mostramos nos exemplos acima. Além da crítica radical devemos esta de forma incondicional nas lutas da classe trabalhadora no campo e na cidade. É na luta que nos tornaremos referência.  Esse é com certeza o caminho para construirmos uma verdadeira alternativa de esquerda no Tocantins.


Pedro Ferreira Nunes – é Educador Popular, Bacharel em Serviço Social, faz parte da Coordenação Geral do Centro Acadêmico de Filosofia da UFT e Milita no Coletivo José Porfírio.

quarta-feira, 17 de maio de 2017

Obrigado Belchior!

Conheci as canções de Belchior no final da minha adolescência e logo se tornaram parte da trilha sonora da minha vida. As três primeiras canções desse grande artista que conheci e que me marcaram profundamente foram – “Comentários a respeito de John”, “Como nossos pais” e “Tudo outra vez”. Eram canções que ouvíamos nas noites frias lajeadenses conversando sobre educação, política e poesia – “saia do meu caminho, eu prefiro andar sozinho, deixem que eu descida a minha vida...”. Mas foi quando deixei o interior tocantinense para morar em terras goianas que as canções de Belchior se tornaram mais presente na minha vida – aquelas letras um tanto melancólicas refletiam justamente o momento que estava vivendo.
Uma das letras que marcaram os meus primeiros dias em terras goianas era “Tudo outra vez – há tempo, muito tempo que estou longe de casa e nessas ilhas cheias de distância o meu blusão de couro já se estragou, ouvi dizer num papo da rapaziada que aquele amigo que embarcou comigo, cheio de esperança e fé já se mandou”. Essa canção sempre me vinha na cabeça, sobretudo quando sentava em algum terminal esperando o ônibus para ir para o trabalho ou voltando para o barracão onde morava. Lembrava que estava longe de casa e que a companheira que havia ido comigo não aguentara e voltara para o Tocantins. Ah, como sentia falta do Tocantins, do Lajeado – das ruas, do rio, da serra, dos amigos e dos amores que aqui deixara.
Apenas um rapaz latino americano” e “Apalo seco” foram canções significativas também nesse período. “Tenho 25 anos de sonho e de sangue e de américa do sul, por força desse destino um tango argentino vai bem melhor que um blues”. Desde então quando era questionado quem eu era e de onde vinha – dizia: “Eu sou apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”. Eu não seria capaz de fazer de minha própria inspiração uma definição tão perfeita de mim mesmo. E quando entrei para faculdade de Serviço Social, Belchior continuou a me acompanhar. Nesse período ouvia muito “Galos, noites e quintais” nas minhas noite de solidão lembrando da minha adolescência no Lajeado – “quando eu não tinha o olhar lacrimoso que hoje trago e tenho... eu era alegre como um rio, um bicho, um bando de pardais, como galos quando havia, quando havia galos noites e quintais, mas veio o vento forte e a força fez comigo o mal que a força sempre faz, não sou feliz, mas não sou mudo, hoje eu canto muito mais”.
Depois veio a militância politica junto aos operários, aos camponeses pobres e aos estudantes. Embalado pelos versos de “Velha roupa colorida – Você não sente nem vê, mas eu não posso deixar de lhe dizer meu amigo, que uma nova mudança em breve vai acontecer”. De “Conheço o meu lugar – não há motivo para festa ora essa não sei rir a toa, fique você com a mente positiva, eu quero voz ativa ela é que é uma boa”. Passava noites em claro escrevendo propaganda subversiva para espalhar nos acampamentos e assentamentos de camponeses pobres interior à dentro como também em outras frentes de lutas que participávamos. O que relatei nos bastidores do diário da ocupação da superintendência do INCRA-GO: “Á noticia também chegou ao ouvido de outros camaradas que começaram a comemorar, no entanto foi preciso alertar para que não se fizesse muito alarde e nem se espalhasse. Em seguida segui para a sede do movimento Terra Livre no setor universitário, chegando lá comprei umas cervejas, coloquei algumas canções do Belchior e comecei a me inspirar para escrever as notas”. (2014; 92).
E essa não foi à única vez que fiz questão de declarar a importância das canções desse grande artista para mim – do quanto me influenciaram e continuam a me influenciar, por exemplo, no poema “Minhas Paixões” onde declaro: “Ouvir Belchior, tomar uma cerveja gelada, fumar um gostoso palheiro, andar nas ruas de madrugada”. Ou no poema “Teu olhar” que escrevi: “Teu olhar de menina me fascina, como as canções de Belchior, como a vida no interior, como um guerrilheiro que luta movido pelo amor”. Belchior também esta presente nas minhas crônicas e contos. Como por exemplo, na crônica “Tudo bem que se fizesse um shopping em Miracema, mas era mesmo preciso acabar com o mercadão?” Escrevi:Como diz a bela canção do Belchior ‘ É você que ama o passado e que não vê que o novo sempre vem’. Será que sou assim? Não é que eu odeie o novo e muito menos amo o passado. O fato é que eu não posso aceitar a lógica de que o novo para subsistir precisa destruir a nossa história. Não, não posso aceitar essa lógica. Claro que o novo deve vir, mas para tanto não precisamos destruir a nossa história”. (2013; 2).
Já se passaram muitos anos desde que escutei pela primeira vez “saia do meu caminho, eu prefiro andar sozinho, deixem que eu descida a minha vida...” Muita coisa mudou, mas continuo fazendo desses versos uma filosofia de vida. E assim continuo sendo um rapaz latino americano com um diploma de sofrer de outra universidade e que ainda é um estudante que sonha e escreve em letras grandes pelos muros do país que viver é melhor que sonhar e que o amor é uma coisa boa. Obrigado Belchior! Obrigado por esta ao meu lado estes anos todos fazendo parte da trilha sonora da minha vida. Uma vida que continua não sei até quando, mas da qual espero me despedir fumando um cachimbo, tomando um conhaque e ouvindo suas canções.

Pedro Ferreira Nunes

Lajeado-TO. Casa da Maria Lucia, Lua Cheia – Outono de 2017.

terça-feira, 9 de maio de 2017

Filosofia e Cinema: Problemas Filosoficos em Dolls: A Esfera Pública e a Esfera Privada e a Questão Ética e Moral.


Por Pedro Ferreira Nunes
Em Dolls, Takeshi Kitano nos apresenta uma estória violenta e poética ao mesmo tempo – estória de alguns personagens que ao romper com ás tradições da sociedade japonesa acabam tendo um destino trágico. No embate entre manter a tradição ou subverte-la, entre cumprir o dever com a coletividade ou satisfazer sentimentos individuais percebemos uma discussão entre ética e moral. Nessa linha salientamos o pensamento de Adolfo Sanchez Vasquez a cerca dessa questão. Para este autor as questões éticas não dizem respeito apenas a nós, mas também a outras pessoas. Já a moral são atos e formas de comportamento dos homens em face de determinados problemas. (Vasquez, 1984). Logo nosso objetivo nesse breve artigo é abordar a questão ética e moral á partir da perspectiva de Adolfo Sanchez Vasquez no filme Dolls de Takeshi Kitano. Antes faremos uma breve abordagem a cerca da questão da coletividade versus individualidade, relacionando tal temática com a influência do pensamento de Confúcio na sociedade japonesa. E ainda nessa linha faremos uma relação do problema a cerca da coletividade versus individualidade com a questão da esfera pública e da esfera privada a partir do pensamento de Hanna Arendt. E por fim abordaremos a violência apresentada em Dolls – uma violência que não é explicita, mas que não deixa de ser impactante. Aliás, o impacto da violência em Dolls esta no fato de que ela não é explicita.
Dolls e a questão da coletividade versus individualidade
O problema a cerca do dever com a coletividade versus a individualidade – de manter a tradição ou subvertê-la é uma das questões centrais que percebemos nas estórias dos personagens de Dolls. Por exemplo, quando Matsumoto decide abandonar o casamento no ultimo momento com a filha do Chefe para resgatar sua antiga noiva que tentara o suicídio após o termino da relação. Já Nukui abandona o seu dever no trabalho para se aproximar do seu ídolo. E Hiro ao romper com as regras rígidas da máfia ao se relacionar em público com sua amada. Em todas essas estórias percebemos o rompimento com o dever com um coletivo para satisfação de desejos individuais. E nesse embate entre deveres coletivos e sentimentos individuais percebemos a influência da filosofia confucionista que ainda hoje tem forte presença na cultura japonesa.
Segundo Ferreira (2008) “a manutenção desse pensamento se dá não apenas num estabelecimento de uma relação hierárquica dentro da sociedade, mas principalmente na força de um pensamento que valoriza o sentimento comunitário, o pertencimento a um grupo, que pode ser a família, a turma, a empresa, acima das individualidades. As relações hierárquicas vão se estabelecer muitas vezes dentro desse sentimento de grupo”. Logo quando os personagens de Dolls rompem com essa logica acabam sendo punidos – todos acabam tendo um destino trágico por romperem com a tradição, com o dever, com a coletividade. E tais decisões acabam desencadeando uma cadeia de violência. Que, aliás, é uma característica desse filme.


A violência em Dolls ou a beleza da dor
Em Dolls, Takeshi Kitano nos apresenta uma perspectiva diferente da violência. Não aquela violência de uns contra os outros que geralmente vemos no cinema, mas sim uma violência contra si mesmo – uma espécie de autopunição, de autodestruição. É o que percebemos, por exemplo, na estória do fã (Nukui) que cega os próprios olhos para se aproximar do seu ídolo – e como consequência acaba morrendo atropelado. Ou do casal de mendigos acorrentados (Sawako e Matsumoto) que caminham para o precipício. Ou do chefão da máfia (Hiro) que por tentar reviver um antigo romance do passado acaba sendo assassinado por não cumprir as regras que seu cargo de chefe da máfia exige. Também podemos afirmar que a violência que mais chama atenção em Dolls não é a violência explicita, mas sim aquela que está em pequenos gestos como, por exemplo, quando o fã pega o estilete para furar os olhos – não precisamos vê-lo furando os olhos para sentir a dor, ou quando o mesmo é atropelado e vemos apenas o vermelho do seu sangue – não precisamos ver o seu corpo ensanguentado para sentir a dor. Já no caso do chefão da máfia a violência não esta quando ele leva os tiros, mas nos segundos antes quando ele olha para os seus capangas que o esperam no carro e percebe que será morto pelas costas. E no caso do casal de mendigos acorrentados é o momento em que ele pega a corda e fica analisando-a, pensando no que irá fazer. Ali percebemos o ponto extremo a que eles chegaram e que os levará para o abismo.
Segundo Ferreira (2012) “em Dolls destaca-se uma violência que não é física, mas sim uma violência dos sentimentos, presente nas relações entre os personagens, na impossibilidade de realização desses relacionamentos”. Porém toda essa violência nos é apresentada de uma forma poética, de uma forma bela. E a beleza tal como a violência esta nas ações e nos gestos. Ações que os levam a romper com os “status cos”, com o pensamento hegemônico, com o “tu deves” – ações que são “gritos de liberdade preso na garganta”. (Garatos Podres, 1993). Ainda nessa linha sobre a forma poética como a violência é apresentada em Dolls é importante destacar a contribuição de Ariano Suassuna ao analisar o pensamento de Aristóteles sobre as categorias de beleza, em especial o sublime e o trágico. Para Suassuna (2008) o Sublime é aparentado com o Trágico, por que ambos despertam o terror e a piedade. A distinção entre os dois se encontra no fato de que enquanto o Trágico é despertado por uma ação, o Sublime se dá pelo pensamento. Logo podemos afirmar que o Sublime está ligado mais as artes literárias, como por exemplo, a poesia épica e a filosofia. Já a tragédia esta mais ligada ao Teatro. E é justamente no Teatro Bunraku que Takeshi Kitano vai se inspirar para contar as estórias trágicas e violentas de seus personagens no filme Dolls.

Dolls e a questão da esfera pública e da esfera privada
Para Arendt (2011) a esfera pública é aquilo que é comum a todos. Logo “a esfera pública, enquanto mundo comum reúne-nos na companhia uns dos outros e, contudo evita que colidamos uns com os outros”. (Arendt, 2011). Percebemos ai a questão do dever – o dever é fundamental para que não colidamos uns com os outros. A coletividade também contribui para que não caminhemos para o isolamento radical. E a partir dai para um processo de negação da pluralidade que pode levar os homens a se tornarem seres privados. Privados no sentido de não conseguir dialogar com o outro. Podemos perceber tal fato em Dolls, sobretudo na estória de Matsumoto e Sawako que caminham para um completo isolamento.
Por outro lado Arendt (2011) também ressalta o risco de se perder a privacidade. Das pessoas não terem direito a viver seus sentimentos para atender o coletivo. Nessa linha a esfera privada acaba se tornando um refugio para o homem diante do mundo comum. Sendo que quando se vive apenas em público acabaríamos tendo uma vida superficial. É justamente disso que os personagens de Dolls buscam fugir – de uma vida superficial. Pois se aceitasse se casar com a filha do chefe Matsumoto não estaria fazendo o que gostaria mais sim a vontade dos seus pais. Logo o que resultaria de uma união forçada era uma vida superficial. Da mesma forma Nukui e Hiro.
Segundo Arendt (2011) “não é de forma alguma verdadeiro que somente o necessário o fútil e o vergonhoso tenham o seu lugar adequado na esfera privada. O significado mais elementar das duas esferas indica que há coisas que devem ser ocultadas e outras que necessitam ser expostas em público para que possam adquirir alguma forma de existência”. A partir dessa reflexão percebemos como é fundamental garantir a existência tanto de uma esfera pública como de uma esfera privada. Á perca de uma dessas ou das duas é perigoso. Nesse sentido podemos concluir que se Matsumoto, Nukui e Hiro optassem por atender aos deveres coletivos, ao invés de sucumbir aos sentimentos individuais, não teriam um destino menos trágico. Pois abrir mão da nossa individualidade de viver o que sentimos para assumir o papel que a sociedade nos impõe não deixa de ser uma violência, uma tragédia. Logo é preciso buscar um meio termo – onde o público e o privado coexistam. Porém em uma sociedade tradicional e hierárquica isso não é uma tarefa fácil. Dai que a saída do auto sacrifício parece ser uma perspectiva mais honrosa. E foi justamente esse o caminho trilhado por Matsumoto e Sawako – o casal de mendigos acorrentados, pelo jovem Nukui – o fã que cegou os olhos, e por Hiro – o chefe da máfia.


Dolls e a questão ética e moral
O problema central em Dolls é a cerca do dilema entre manter a tradição ou subverte-la, em cumprir os deveres com o coletivo ou realizar seus desejos individuais. Nas estórias que se entrelaçam os personagens decidem romper com o coletivo para viver seus desejos individuais. Eles decidem se isolar na esfera privada e se afastarem completamente da esfera pública. E tal decisão acaba os levando para um final trágico. Por outro lado, se eles houvessem optado em seguir um caminho oposto, isto é, se cumprissem os deveres exigidos pelo coletivo, teriam tido um destino menos trágico? Como afirmamos anteriormente, acreditamos que não. E do ponto de vista da ética e da moral como podemos ver essa questão central que nos apresenta Takeshi Kitano em seu Dolls? Antes propriamente de abordar essa questão nos cabe aqui brevemente diferenciar a ética de moral.
Nessa linha ressaltamos que a ética é generalista, logo seus princípios devem ser universais. Ela se torna, portanto de caráter mais teórico do que prático. Logo o que se faz concretamente está mais ligado à questão moral do que ética. Sendo assim, a ética esta ligada a teoria enquanto a moral a prática. Diante disso fica claro que em Dolls as ações dos personagens são de ordem moral e não éticas.
É possível falar em comportamento moral somente quando o sujeito que assim se comporta é responsável pelos seus atos, mas isto, por sua vez, envolve o pressuposto de que pôde fazer o que queria fazer, ou seja, de que pôde escolher entre duas ou mais alternativas, e agir de acordo com a decisão tomada. O problema da liberdade da vontade, por isso, é inseparável do da respon­sabilidade. (Vasquéz, 1984)
Matsomoto, Sawako, Nukui e Hiro agiram moralmente pelo fato de que todos eram responsaveis pelos seus proprios atos, tinham mais de uma opção, e quando decidiram por tal opção seguiram até as ultimas consequências. Logo ao exercerem a liberdade de escolha, tiveram que arracar com as responsabilidades adivindas de suas decisões. Mas esse comportamento moral baseado na individualidade choca com a moralidade hegemonica. Isto é, com a moralidade da comunidade. E isso percebemos claramente em Dolls, um conflito entre morais distintas. Tal fato é uma caracteristica de uma sociedade fundamentada na divisão de classes, concepções diferentes de morais, e, por conseguinte uma disputa entre estas. Assim Vasquéz (1984) vai afirmar que a moral tende a se diversificar de acordo com os interesses antagonicos. E isso contribuie para que se tenha um progresso moral. Claro que numa sociedade tradicionalista e hierarquica como é a japonesa esse progresso moral é um tanto mais lento como em outros países – onde existe uma maior disputa de classes e, por conseguinte de morais. É justamente nesse interim que entra a ética.
Segundo Vasquéz (1984) “A ética parte do fato da existência da história da moral, isto é, toma como ponto de partida à diversidade de morais no tempo, com seus respectivos valores, princípios e normas. Como teoria, não se identifica com os princípios e normas de nenhuma moral em particular e tampouco pode adotar uma atitude indi­ferente ou eclética diante delas. Juntamente com a explicação de suas diferenças, deve investigar o princípio que permita com­preendê-las no seu movimento e no seu desenvolvimento”.
Nessa linha podemos fazer uma leitura de Dolls como uma obra que aborda a questão ética – o filme de Takeshi Kitano não busca determinar ou criar uma nova moral, mais sim analisar a história da moral no Japão e como ela se consolidou. Uma moral hegemônica baseada num dever com o coletivo, com a hierarquia e a tradição. Mas sem esconder os conflitos morais que existe no país. Assim Kitano contribui com seu filme não apenas para que compreendamos a moral ou as morais japonesa, mas também o seu desenvolvimento.

Conclusão
Partindo da concepção de que a Filosofia possui problemas, sendo que segundo Porto (2002) a unidade dinâmica interna desses problemas é o que está na base da multiplicidade e da mudança de temas e opiniões. E ainda que o caminho para entendermos um autor é ver a sua filosofia como resposta “ao” problema que ele se coloca. Assim buscamos analisar e compreender o filme Dolls do cineasta Japones Takeshi Kitano a partir dos problemas filosoficos que ele nos apresenta, isto é, a questão da esfera pública e da esfera privada e a questão da ética e da moral. E para compreender essas questões buscamos as reflexões dos filosofos Aldofo Sánches Vasquéz e de Hanna Arendt. O que nos levou a concluir que a ética e a moral é um tema central discutido em Dolls.


Referências bibliográficas
ARENDT, H. A Condição humana. 10º ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2011.
FERREIRA, GUSTAVO HERINQUE LIMA. Dolls: O teatro Bunraku no cinema de Takeshi Kitano. UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. AVANCA | CINEMA 2012.
GAROTOS PODRES. Aos fuzilados da CSN. CD canções para ninar. Vol. 01 – São Paulo: Independente, 1993.
PORTO, MARIO ARIEL GONZALEZ. A filosofia a partir de seus problemas. São Paulo: Ed. Loyola, 2002.
SUASSUNA, ARIANO. Iniciação á Estética. – 9º edição – Rio de Janeiro: José Olympio, 2008.
VÁSQUEZ, ADOLFO SÁNCHEZ. Ética. - 4º ed. Barcelona: Editorial critica, 1984.

quarta-feira, 3 de maio de 2017

Notas de um dia histórico: Estudantes, Professores e Técnicos Administrativos da Universidade Federal do Tocantins participam da maior Greve Geral da História do Brasil.

*Por Pedro Ferreira Nunes
Era pouco mais das 05h30 da manhã quando chegamos ao campus Palmas da Universidade Federal do Tocantins para nos somarmos aos técnicos administrativos e professores do Comitê Reage UFT que ali estavam para fazer um piquete e mobilizar a comunidade acadêmica a aderir à greve geral. Não perdemos tempo e logo abrimos nossas faixas que davam o recado: GREVE GERAL! FORA TEMER: EM DEFESA DOS NOSSOS DIREITOS. SERVIDORES DA UFT NA LUTA! UFT NA LUTA E NAS RUAS: CONTRA AS REFORMAS DO GOVERNO TEMER! UFT NA GREVE GERAL: EM DEFESA DOS DIREITOS DOS SERVIDORES PÚBLICOS! Com megafone em punho anunciávamos – 28 de Abril é Greve no Brasil. E assim, aos poucos mais e mais pessoas foram se incorporando ao movimento que também recebia a solidariedade dos motoristas que por ali passavam seguindo rumo a BR – 153.

Os primeiros raios do sol da manhã chegaram trazendo consigo os primeiros ônibus. Logo pensamos, é agora que começará os questionamentos e as tentativas de furarem o piquete. Mas para nossa felicidade á maiorias dos ônibus que chegavam estavam completamente vazios. Apenas um ou outro estudante desavisado que não criou problema algum. Isso nos mostrou o quanto havia sido bem sucedido o trabalho de mobilização para greve geral realizado pelo comitê Reage UFT – um trabalho que começou ainda no início de abril e que realizou reuniões, assembleias e discussões com toda a comunidade acadêmica no sentido de convencê-la da importância de aderir a greve geral. E como fruto desse trabalho árduo não houve nenhuma resistência por parte de professores, estudantes, técnicos administrativos ou dos terceirizados no sentido de furar a greve geral na UFT.

O único problema que tivemos foi com dois servidores da Unitins que tentaram furar o piquete, já que para chegar ao campus Graciosa da Unitins é preciso passar pelo portão da UFT. Estes servidores chegaram a nos ameaçar. Mas logo foram convencidos do contrário. A maioria dos estudantes que chegavam nos ônibus eram da Unitins também. Mas em nenhum momento tentaram forçar a entrada, pelo contrário disseram que só estavam ali por que a direção da Unitins e seus professores haviam lhes obrigados a irem utilizando-se claramente da “prova” como instrumento de coerção.

O gozado é que esse professor que obrigou os seus estudantes a irem para aula e não participar da greve, pois se não perderiam a prova e levariam bomba, nos acusou de obrigar as pessoas a aderir ao movimento grevista. Ora, qual a moral de um sujeito desses que fazendo uso de sua autoridade tentou obrigar seus estudantes a boicotar o movimento grevista? Foi à mesma atitude de patrões que ameaçaram cortar o ponto de seus funcionários e dos governos de plantão que se utilizando das forças policiais reprimiu os manifestantes Brasil afora. No entanto não conseguiram impedir que a greve geral fosse realizada com êxito. Mas esse episódio também deve nos servir de lição para que na próxima façamos um trabalho de base na Unitins tal como fizemos na UFT e no IFTO.
Marcha Unificada das Centrais Sindicais e Movimentos Sociais na JK
O Sol estava alto, enquanto isso mais pessoas se somavam ao piquete na entrada do campus Palmas. As noticias que nos chegavam de outras partes eram animadoras – São Paulo e outros grandes centros estão parados. O interior do Tocantins também em luta – Porto Nacional, Araguaína, Gurupi, Tocantinópolis, Divinópolis, Miracema. Na avenida JK em frente ao Colégio São Francisco milhares de manifestantes se concentravam para marcha unificada.
Com o nosso primeiro objetivo cumprido ali no portão da UFT era o momento de se somar aos outros trabalhadores e organizações sociais na marcha unificada. E assim fizemos, saímos em comboio pelas ruas de Palmas até o local da concentração. Ao longo do caminho não pude deixar de notar o estacionamento do shopping vazio – o que nos trouxe grande felicidade. Vazio também estava o comercio na avenida JK e os ônibus que circulavam com um ou outro desavisado.
Era por volta das 09h da manhã quando a marcha partiu cortando á avenida JK em sentido ao palácio Araguaia. Eram milhares de trabalhadores de diversas categorias – com faixas, bandeiras e cartazes – professores, servidores gerais, trabalhadores sem teto, trabalhadores sem terra e a juventude. Aliás, era a juventude com seu fervor e entusiasmo – cantando, dançando, e gritando palavras de ordem que seguia na linha de frente. Estudantes, Professores e Técnicos Administrativos da UFT vinham em seguida com grande entusiasmo. Entusiasmo que ia aumentando com a incorporação cada vez maior de estudantes, professores e técnicos administrativos que haviam ido direto para a marcha. O que fez com que o bloco coordenado pelo comitê Reage UFT fosse um dos mais destacados na manifestação.

Enquanto a marcha seguia triunfante, um helicóptero da policia militar a mando do governador Marcelo Miranda (PMDB) nos provocava ameaçadoramente com agentes fortemente armados. Os policiais que acompanhavam do chão tentavam impedir que tomássemos toda a pista. Mas não tiveram êxito, as provocações por parte do aparelho repressivo só aumentou a nossa disposição. E assim a marcha seguiu. Seguiu firme até chegar ao seu destino final. E ali encerramos com um grande ato onde as diversas organizações presentes falaram contra as reformas do governo Temer, pediram por sua saída e conclamaram por eleições gerais já.
Algo que gostaríamos de destacar foi de fato o caráter unitário da manifestação em Palmas. Algo que eu particularmente ainda não havia visto. Centrais sindicais e movimentos sociais deixando de lado suas diferenças para marchar conjuntamente numa luta comum – sem brigas, sem disputa de ego para ver quem dirigia o movimento. CUT, UGT, Força Sindical, CTB, CSP-Conlutas, NCST. Além dos sindicatos, dos movimentos sociais, e da juventude trabalhadora. Me dei conta dessa unidade quando num dado momento uma camarada passou por mim com uma camisa da CUT, um chapéu da UGT e uma bandeira da CTB na mão.
Breve balanço
O principal objetivo de uma greve geral não é apenas colocar milhares de trabalhadores nas ruas. Mas sim atingir o bolso do capitalista, parar economicamente o país, e incomodar governos e patrões. E esse objetivo a greve do dia 28 de Abril alcançou inquestionavelmente. Ora, a mesma impressa que tenta desqualificar o movimento noticia que houve locais em que a queda das vendas no comercio chegou a 70%. Outro veiculo de comunicação aponta uma estimativa de perca de 5 bilhões de faturamento em todo o Brasil. As imagens do comercio com portas fechadas, ruas vazias e ônibus e metrôs parados falam por si só e é muito mais significativo do que milhares de pessoas com uma camisa da seleção brasileira de futebol num domingo a tarde caminhando como gado obedecendo a elite oligárquica que comanda o país.

Ao contrário de alguns camaradas, não me causa nenhuma indignação à cobertura da imprensa brasileira a cerca da greve geral. Muito pelo contrário, isso é um ótimo sintoma. Senti fortemente os ares de junho de 2013 quando as manifestações que começaram a crescer a cada dia obrigou a grande imprensa e os governos de plantão a mudar o discurso. Ora não é nenhuma surpresa a tentativa por parte do governo e da imprensa de desqualificar o movimento legitimo dos trabalhadores e, por conseguinte criminaliza-lo. Novamente vemos o discurso que tenta dividir os “bons manifestantes e os maus manifestantes”, como também uma linha de dar ênfase maior nos confrontos violentos. Tudo isso é um sintoma forte do abalo causado pela greve geral.
Ora, “dizei-me anêmicos e anões” desde quando se faz movimento grevista para agradar o patronato e o governo? Se faz greve justamente para incomodar. E o fato é que incomodamos, incomodamos e muito. E isso sim é democracia, como afirma o professor José Paulo Netto “quem quer democracia conversando do palácio com luva de pelica, na verdade nem quer conversar e nem quer democracia”.
Por fim é preciso destacar uma diferença da greve geral com as manifestações de junho de 2013. Agora temos uma direção política e esse fato abre uma grande perspectiva para o próximo período, logo não tenho duvida que uma próxima greve geral, á qual não devemos ter receio e nem devemos perder tempo em começar a articular, será muito maior e mais histórica do que essa greve. Sigamos sem vacilar nessa luta, hasta la victoria siempre!

*Coordenador do Centro Acadêmico de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins, Membro do Comitê Reage UFT e militante do Coletivo José Porfírio.

E a crise governador?

Desde que assumiu o governo do Estado pela terceira vez Marcelo Miranda (PMDB) vem afirmando que o Tocantins passa por uma grande crise econômica. Foi em nome dessa crise que aprovou um ajuste fiscal aumentando impostos sobre a população tocantinense, especialmente o ICMS. Foi em nome dessa crise que realizou uma reforma administrativa acabando com algumas secretarias e fundindo outras, com destaque para secretaria de Cultura. Foi em nome da crise que passou a pagar os servidores quase na metade do mês. E em nome da crise parcelou o pagamento da data-base. A lista não é pequena, portanto paremos por aqui. Vamos ao que interessa, isto é, mostrar aquilo que sempre afirmamos, de que a crise tão propalada pelo governo Marcelo Miranda não passa de um engodo.
Ora se o Estado do Tocantins esta em crise como é que o governador cria novas secretarias de governo onerando assim os cofres públicos? Quer dizer então que acabou a crise? Não, a crise não acabou. E não acabou por que simplesmente nunca existiu. A própria declaração do governo dizendo que os impactos financeiros com a criação dessas novas secretarias será mínimo mostra bem. “... as estruturas dessas pastas já existiam e a maioria dos cargos vai ser apenas realocado”. Ora, portanto na prática quer dizer que a então reforma administrativa de 2016 foi apenas para criar uma cortina de fumaça para que o governo Marcelo Miranda aumentasse impostos e deixasse de pagar corretamente os direitos dos servidores estaduais? Enquanto discursava para população de que estava cortando na própria carne, na verdade estava apenas maquiando a realidade.
Por outro lado a declaração de que os impactos financeiros nos cofres do Estado serão mínimos tem uma contradição, pois ao mesmo tempo que afirma que irá aproveitar uma estrutura já existente que havia sido apenas realocada, também afirma que criará cargos de secretário, subsecretários e algumas gerencias. Ora são justamente os cargos que tem os maiores impactos na folha de pagamento, já que estes servidores ganharam salários bem superiores aos demais. Deve ter sido por isso que ao mesmo tempo em que criou as novas secretarias anunciou um corte no orçamento na casa dos 63 milhões. Pois afinal das contas, alguém tem que pagar a conta com a criação dessas novas secretarias e esses novos cargos comissionados.
Diante de tudo isso uma coisa esta clara, não existe crise, a crise é uma falácia do governo para tirar direitos dos trabalhadores. Outra questão é que não podemos ficar calados, devemos denunciar amplamente – a recriação da Secretaria de Articulação Politica, da Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano. E a criação da Secretaria Extraordinária de Assuntos Comunitários – onde nomeou um ex-deputado para o cargo. Atende a um único proposito – comprar apoio político para as próximas eleições ao governo do Estado – na qual Marcelo Miranda pretende concorrer à reeleição.

Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio.